Dói-me a cabeça aos trinta e nove anos.
Não é hábito. É rarissimamente que ela dói.
Ninguém tem culpa.
Meu pai, minha mãe descansaram seus fardos,
não existe mais o modo
de eles terem seus olhos sobre mim.
Mãe, ô mãe, ô pai, meu pai. Onde estão escondidos?
É dentro de mim que eles estão.
Não fiz mausoléu pra eles, pus os dois no chão.
Nasceu lá, porque quis, um pé de saudade roxa,
que abunda nos cemitérios.
Quem plantou foi o vento, a água da chuva.
Quem vai matar é o sol.
Passou finados não fui lá, aniversário também não.
Pra quê, se pra chorar qualquer lugar me cabe?
É de tanto lembrá-los que eu não vou.
Ôôôô pai
Ôôôô mãe
Dentro de mim eles respondem
tenazes e duros,
porque o zelo do espírito é sem meiguices:
Ôôôôi fia.
Adélia Prado, Poesia reunida
3 Comentários
Miguel Francisco da Cunha safe
11/12/2021 at 08:52Adélia é o fino e mais humano sentimento. É sempre o quê sinto e não sei dizer.
Rosana Marques
23/03/2023 at 09:51Meu caso também, Miguel…
Rosana Marques
23/03/2023 at 09:50Esse poema é de uma finura, ou seria fineza, delicadeza, água morna no corpo cansado… não sei, sei que me preenche toda como quando fui pro balão de oxigênio numa crise braba de asma… o mundo se abre maravilhosamente belo, fico feliz inteira…