Por que mentias, leviana e bela,
Se minha face pálida sentias
Queimada pela febre?… e minha vida
Tu vias desmaiar… por que mentias?
Acordei da ilusão! a sós morrendo
Sinto na mocidade as agonias.
Por tua causa desespero e morro…
Leviana sem dó, por que mentias?
Sabe Deus se te amei! sabem as noites
Essa dor que alentei, que tu nutrias!
Sabe este pobre coração que treme
Que a esperança perdeu porque mentias!
Vê minha palidez: a febre lenta…
Este fogo das pálpebras sombrias…
Pousa a mão no meu peito… Eu morro! eu morro!
Leviana sem dó, por que mentias?
Toda aquela mulher tem a pureza
Que exala o jasmineiro no perfume,
Lampeja seu olhar nos olhos negros
Como, em noite d’escuro, um vagalume…
Que suave moreno o de seu rosto!
A alma parece que seu corpo inflama…
Simula até que sobre os lábios dela
Na cor vermelha tem errante chama…
E quem dirá, meu Deus! que a lira d’alma
Ali não tem um som — nem de falsete!
E, sob a imagem de aparente fogo,
É frio o coração como um sorvete!
Álvares de Azevedo, Lira dos Vinte Anos
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