Ana Martins Marques

Ana Martins Marques – Poema de amor

Este é um poema de amor

por isso nele
não poderá faltar
a menção a alguma
flor

e por isso digo
rosa
ou lírio
ou simplesmente
rubro,
rubro

e espero as páginas
imantarem-se
de vermelho

por isso digo
febre
e noite
e fumo

para dizer
ansiedade e
desperdício de sêmen e de horas
e cigarros à janela
acesos como estrelas
com a noite numa ponta
e nós
consumindo-nos
na outra

este é
definitivamente
um poema de amor

por isso nele
devo dizer casa
e olhos
e neblina

e não devo dizer
que o amor é uma doença
uma doença do pensamento
uma desordem que põe tudo o mais
em desordem
uma perda que põe tudo
a perder

e porque é
um poema de amor
sob pena de ser devolvido
como uma carta sem destinatário
(e todos sabem que não se deve
brincar com os correios)
este poema deve dirigir-se
a alguém

porque a alguém o amor deve ferir
com sua pata negra

e então
à falta de outro
este poema
eu o dedico
(mas não tema,
o tempo
também nisso
porá termo)
a você

Ana Martins Marques, Da artes das armadilhas

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