Lá em casa tinha um pote
com água sempre gelada,
as cadeiras na calçada
e o rádio tocando xote.
Galinha, pato, capote,
vizinho, amigo e parente.
Tinha a vista do nascente
com sua beleza rara.
A casa não era cara
mas era a cara da gente.
Todo ano pai pintava
a fachada duma cor
sem precisar de pintor,
pois eu também ajudava.
Pai de tudo me ensinava,
matuto, mas consciente,
dizia insistentemente:
“A vida é quem lhe prepara.”
A casa não era cara
mas era a cara da gente.
Quadro de Frei Damião,
estátua de Padim Ciço,
um cachorrinho mestiço
que nunca comeu ração.
A chama de um lampião
que brilhava reluzente
de seis da tarde pra frente
deixando a noite mais clara.
A casa não era cara
mas era a cara da gente.
Mãe guardava na despensa
farinha, milho, feijão,
rapadura, macarrão,
a lista era muito extensa.
Cada fí pedia a bença
a seus pais diariamente.
Se hoje eu ficar doente
a bença ainda me sara.
A casa não era cara
mas era a cara da gente.
Lá não tinha celular
pra navegar pela rede.
Tinha rede na parede
pra deitar e balançar,
um quintal pra nós brincar
na chuva e no sol quente,
pois ser criança é urgente
já que o tempo nunca para.
A casa não era cara
mas era a cara da gente.
Meus carrinhos de madeira
espalhados pelo chão,
peteca, bila, pião,
bola, pipa e roladeira.
Hoje a tela virou feira
e o brinquedo é diferente.
Por mais que o tablet tente,
garanto: nem se compara.
A casa não era cara
mas era a cara da gente.
Bráulio Bessa, Um Carinho na alma
1 Comentário
Luciana Santos de Oliveira
05/03/2021 at 10:19Amo poemas e sou apaixonada nos poemas desse nosso maravilhoso Bráulio Bessa