Caio Meira – Um amor

o tempo de uma hora não é o tempo de uma
hora, uma noite não é uma noite, uma madrugada feita
de vários anos, feita também de milhares de reais, uma
manhã que se aproxima com seus tempos, seus dinheiros,
suas fotos, suas cirurgias, seus cortes de cabelos,
com os filhos que se desprenderam de tardes e noites,
com concursos mal feitos e empregos meia-boca, o fim da
noite que se vai cheia de livros não lidos, suas mãos, as mais
macias, suaves e carinhosas de todo o planeta, o tempo
que se crava em minhas costas ou que acaricia meus cabelos,
o tempo em refluxo no meu esôfago, meu tempo ao lado
do seu tempo, em nossos genitais, em nossa cama,
o tempo em cápsulas ocultas que nos aguardam para
explodir, para disparar como um alarme de carro
dispara na madrugada, ou para embalar nossos
brindes, nossos olhares, o tempo engarrafado que
bebemos como licor antes de dormir, o tempo de vinte anos
em poucos minutos, de mãos dadas, chorando às 3 da
manhã, sorrindo ou se assustando, o tempo do coração
que não disparou como alarme de carro, mas que bate
compassado e assegura a imortalidade do nosso romance
entrelaçado nos segundos e anos que ataram o meu corpo
no seu, um amor

 

Caio Meira, Romance