Ó minh’alma, dá o salto mortal e desaparece na bruma, sem pesar!
Sem pesar de ter existido e não ter saboreado o inexistível.
Quem sabe um dia o alcançarás, alma conclusa?
Ó minh’alma, irmã deserta, consola-te de me teres habitado,
se não fui eu que te habitei, hóspede maligno,
com irritação, com desamor, com desejo de ferir-te:
que farei sem ti, agora que te despedes
e não prometes lembrar este corpo destituído?
Ó minha, ó de ninguém, ó alma liberta,
a parceria terminou, estamos quites!
Carlos Drummond de Andrade, Farewell
1 Comentário
joão
14/07/2021 at 13:41há também um poema de drummond chamado “desligamento do poeta”, publicado dois dias após a morte de manuel bandeira. o mesmo desligamento, a mesma fratura, mas agora em relação ao outro, àquele que também era poeta, também pensou e disse a morte (profundamente). acho bonita a autorreferência do drummond falando de fora, do outro, que se aproxima do próprio drummond pelo único aspecto que ele faz questão de destacar no título, e que diferencia um poema do outro: DO POETA. de alguma forma carlos fala da própria morte mas, mais que isso, fala da morte do amigo, a única morte experienciável por aquele que ainda vive.