Sou mais aquilo que não fiz de mim
sou o que sendo poderia ser
projeto inacabado de presente
onde trespassado pela ausência
soergo a diáspora de receios e anseios
a outros mesmos cantos do que eu seria
Sou também o que me fizeram
tangenciado por acertos erros e projetos de outrem
objeto talhado pela (in)consciência coletiva
embalado pelas mãos do sono, do ódio e do afeto
que me despertam da ilusão de ser um só
Sou este ente pensado
criado recortado bricolado
pelo teorema dos meus nossos juízos sobrepostos
o mamulengo da sorte
a morder as cordas que me prendem e me protegem da queda
Sou o recorrente suicídio,
calculado tacitamente por intenções contrárias
como desculpa e apelo à permanência
Sou definitivamente a farsa do meu fim
Sou o histrião da repetição da invenção humana
a gargalhar da própria difusa fecundidade
Seria até minha desconstrução
não fosse esta meritosa condenação
de — supostamente — ser alguém.
Adrilles Jorge, Antijogo