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Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin – Disk-Morte

antonio carlos secchin

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Antonio Carlos Secchin, Desdizer

Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin – Linha de fundo

antonio carlos secchin

Assim meio jogado pra escanteio,
volto ao poema, este local do crime.
Mas é o desprezo que melhor exprime
aquilo que no verso eu trapaceio.
Se nada do que digo me define,
cópia pirata de um desejo alheio,
revelo a ti, leitor, o que eu anseio:
um abutre no cadáver do sublime.
A matéria é talvez muito indigesta,
me obriga a convocar um mutirão
para acabar com toda aquela festa
de pétalas e plumas de plantão.
Memória derrubada pelo vento,
quero aqui só lembrar o esquecimento.

Antonio Carlos Secchin, A estante dos poetas: Antologia

Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin – Carta aos pais

antonio carlos secchin

Vem de um sonho distante
o que aqui celebro novamente:
o amor e seu motor incessante
que incendeia de luz toda a gente.
Catorze de janeiro sessenta vezes
ainda assim não é bastante:
tudo que parecia tão antigo
ressurge na força deste instante.
Sessenta vezes ser feliz inteiro,
por inteiro ser companheiro e amante.
Mil novecentos e quarenta e sete,
clara memória, afeto transbordante
que gerou Carlos, Antonio e Cristina,
ao abrigo do vento e da vida errante.
Regy e Sives, tanta alegria de ver
que vale viver, se viver intensamente
é ação recomeçada em cada dia,
para que cada dia se reinvente.
Nossa herança maior – os pais
que sabem nos chamar para o futuro,
pais que não são de antigamente,
pois o que eles fazem do passado
é trazê-lo sempre perto do presente.
Pais, queridos pais, sessenta anos
aqui se condensam diante de nós,
e, mesmo que nossa voz não cante
tanto quanto se presume,
que agora, então, se proclame
a conta incontornável
deste amor que número nenhum resume.
O tempo, que é velho e que é infante,
nesta hora entra na sala, lentamente.
Aproxima-se de Sives e Regy,
e vê que o par, de tão perfeito e tão constante,
já se tornou eterno nessas bodas,
que, como o casal, são de puro diamante.

Antonio Carlos Secchin, Desdizer e antes

Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin – À Noite,

antonio carlos secchin

todas as palavras são pretas
todos os gatos são tardos
todos os sonhos são póstumos
todos os barcos são gélidos
à noite são os passos todos trôpegos
os músculos são sôfregos
e as máscaras, anêmicas
todos pálidos, os versos
todos os medos são pânicos
todas as frutas são pêssegos
e são pássaros todos os planos
todos os ritmos são lúbricos
são tônicos todos os gritos
todos os gozos são santos

Antonio Carlos Secchin, Hálito das pedras

Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin – Autoria

antonio carlos secchin

Por mais que se escoem
coisas para a lata do lixo,

clipes, cãibras, suores,
restos do dia prolixo,

por mais que a mesa imponha
o frio irrevogável do aço,

combatendo o que em mim contenha
a linha flexível de um abraço,

sei que um murmúrio clandestino
circula entre o rio de meus ossos:

janelas para um mar-abrigo
de marasmos e destroços.

Na linha anônima do verso,
aposto no oposto de meu sim,

apago o nome e a memória
num Antônio antônimo de mim.

Antonio Carlos Secchin, Hálito das pedras

Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin – Poema do infante

antonio carlos secchin

É a noite.
E tudo escava tudo
na língua ambígua que desliza
para o esquivo jogo.
Amargo corpo,
que de mim a mim se furta,
não recuso teu percurso
no hálito das pedras
que me existem em ti
– estéril dorso entre águas
estancadas.
O nada, o perto, o pouco,
não posso dividir
do que se espera o que me habita,
ao fazer fluir a via antiga
de um menino que mediu o lado impuro.
Operário do precário,
me limito nesse corpo amanhecido,
asa e gozo onde a morte mora.
Minha vida, mapeada e descumprida,
está pronta para o preço dessa hora.

Antonio Carlos Secchin, Hálito das pedras

Antonio Carlos Secchin

Antonio Carlos Secchin – Tempo: saída & entrada

antonio carlos secchin

No tempo de minha avó,
meu feijão era mais sério.
Havia um ou dois óculos
me espiando atrás
de molduras roídas.
Mas eu era feliz,
dentro da criança
o outono dançava
enquanto pulgas vadias
dividiam os óculos.
Dentro da criança,
as pulgas espiavam
o outono vazio,
dividiam minhas molduras
roídas por óculos vadios.
No tempo de meu feijão
minha avó era mais séria.

Antonio Carlos Secchin, 26 poetas hoje (Heloísa Buarque Holanda)