Um tremor
Um temporal
Uma nuvem
Pequena Normal
Uma calúnia
Contra o sol
Um dia de chuva
Afinal
Qualquer coisa
Um contratempo
Que dê notícias
Do vento
E quem sabe uma
Explosão
Como o estrondo
De um trovão
Cesar Nascimento, Nuvem
Um tremor
Um temporal
Uma nuvem
Pequena Normal
Uma calúnia
Contra o sol
Um dia de chuva
Afinal
Qualquer coisa
Um contratempo
Que dê notícias
Do vento
E quem sabe uma
Explosão
Como o estrondo
De um trovão
Cesar Nascimento, Nuvem
Num reino que imaginei quando infante,
Minha rainha tinha os olhos teus.
E naquele reino, agora distante,
Eu enfrentava a inveja de Deus.
Mas eis-me velho, sabido, cansado,
Desenganado e entre os filisteus.
Foi-se a rainha e o reino dissipado.
Morto o menino, seu sonho morreu.
Mas a despeito do passado inglório,
Vi que o destino jamais me esqueceu,
Pois só com o brilho que sai de teus olhos,
Tu me tornaste o maior dos plebeus.
Cesar Nascimento, Nuvem
Fazer política é tarefa comum.
Conquista-se um voto,
Eleva-se um ponto:
Metade mais um.
Fazer política não é complicado.
É saber costurar
Quando a linha faltar
Ao já mal remendado.
Fazer política é fazer-se calado,
Esquecer o que ouvir
E não mais discutir
O que for acordado.
Fazer política é fazer a notícia;
É ser bem comentado,
Para não ser cassado
E encarar a polícia.
Fazer política só tem um mistério:
O segredo é fugir
Quando se houver de rir –
O político é sério!
Cesar Nascimento, Nuvem
Perdoa-me, amor, meu pranto,
Que me custa portar-se assim.
Perdoa-me e foge de mim.
Perdoa-me por tudo, por nada.
Perdoa-me pelo que não fiz.
Mas perdoa-me, amor, calada,
Que já hoje não sou feliz.
Sim, meu amor, perdoa-me
Por tudo o que ainda te peço.
(Eu sei que é caro o perdão.)
Perdoa esse amor confesso.
Perdoa esse amor em vão.
Cesar Nascimento, Nuvem
A rosa é tão doce
Que, não fosse rosa,
Ainda rosa seria.
O nome de rosa,
Em verso ou em prosa,
É tudo o que
A rosa não tem.
A rosa tem somente
Aquilo que ela é:
Rosa apenas
E rosa também
Quando ainda em seu botão
Ou, já quase uma não-rosa,
É só pétalas no chão.
Cesar Nascimento, Nuvem
Como querer te comparar ao mar
Se o mar é parte do que cabe em ti,
E se o resumo disso que senti
É o só desejo de te navegar?
Por ti me ponho a enfrentar o mar,
E navegar-te é meu maior prazer.
E além de tudo que eu puder dizer,
Conservo o sonho e o querer te amar.
Mas eis que surge na procela um vão,
E o vento, a onda, escuridão sem fim
E o mais que habita tua imensidão
Transtornam nauta e nau em não e sim,
Como se o vento os quisesse virar,
E o navegante não dá mais de si
E o rivaliza e joga a vela ao mar,
Eis que disposto a naufragar em ti.
Cesar Nascimento, Nuvem
Dizem que o amor faz de dois um.
Sim, mas não completamente!
Dois são um quando um, ausente,
Ressurge no sonho do outro,
Que acorda com olhos dormentes
E sonha de dia, acordado.
Dois são um, sim, e se amam,
E, no entanto, é amor incompleto,
Pois, amantes, seus corpos reclamam
O direito de se ter mais perto,
De dormir também um, apertados,
Com a boca úmida, quentes, suados.
Cesar Nascimento, Nuvem
Sou muito feliz assim, sozinho.
Sinto a solidão como uma estrada,
Que do meu vazio leva a nada.
Nunca alguém se põe no meu caminho.
Posso mais querer que o passarinho,
Que não tem amor, ciúme ou pranto?
Sem poder sofrer tal desencanto,
Largo eu vôo e plácido definho.
Tenho mil razões para esse jeito
Meu de ser assim tão afastado
Das mais vis tristezas que não tive.
Mas não conto – eu, que sou calado –
Como se alcança o fim perfeito.
Não vou te ensinar como se vive!
Cesar Nascimento, Mensagem do Exílio
Não tenha medo de morrer
Não tenha pressa
Viva seu termo com calma
Não tenha pressa
Aproveite o momento
Mas faça seus planos
Nem tudo acaba agora
Procure o mais lento
Espalhe-se sobre os anos
Conquiste o futuro
Não tenha tantos amores
Que não lhe sobre tempo
Proteja-se do medo
De estar perdendo
Se a vida lhe apressar
Jamais se apavore
Só há uma vida, só uma
Mas uma é bastante
Perceba que a calma é virtude
Que afasta o sofrimento
Evite os abandonos amiúde
E entregue-se ao tempo
Cesar Nascimento, Mensagem do Exílio