Cecília Meireles

Cecilia Meireles – I (um)

cecilia meireles
image_pdfimage_print

O rumor do mundo vai perdendo a força,
e os rostos e as falas são falsos e avulsos.
O tempo versátil foge por esquinas
de vidro, de seda, de abraços difusos.

A lua que chega traz outros convites:
inclina em meus olhos o celeste mapa,
desmorona os punhos crispados do dia,
desenha caminhos, transparente e abstrata.

Árvores da noite… Pensamento amante…
– Transporta-me a sombra, na altura profunda,
aos campos felizes onde se desprende
o diurno limite de cada criatura.

É a noite sem elos… Inocência eterna,
isenta de mortes e natividades,
pura e solitária, deslembrada, alheia,
mudamente aberta para extremas viagens.

Eu mesma não vejo quem sou, na alta noite,
nem creio que SEJA: perduro em memória,
à mercê dos ventos, das brumas nascidas
nos dormentes lagos que ao luar se evaporam.

Recebo teu nome também repartido,
quebrado nos diques, levado nas flores…
Quem sabe teu nome, – tão longe, tão tarde,
tão fora do tempo, do reino dos homens…?

Cecilia Meireles, Doze noturnos da Holanda

Você gostou deste poema?

Você Pode Gostar Também

Sem comentários

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.