Eu sempre te disse que era grande o oceano
para a nossa pequena barca.
Cantavas, quando eu te dava o desengano
de partir por água tão larga.
Não, tu não devias ter ido.
Mas foi tempo perdido.
Eu sempre te disse que os olhos de um morto
ficavam nas águas suspensos,
procurando os vivos, os mastros, o porto,
na oscilação de águas e ventos.
Não, tu não devias ter ido.
Mas era amor perdido.
Teço velas negras para a barca nova,
redes de prata para as ondas.
Ensinai-me, peixes, sua funda cova
nestas escuridões tão longas!
Não, tu não devias ter ido.
E isto é pranto perdido.
Cecilia Meireles, Retrato Natural