Cesare Pavese

Cesare Pavese – A noite

Mas a noite de ventos, a límpida noite
que a lembrança roçava de leve, é remota,
é lembrança. Perdura uma calma aturdida,
um sossego de folhas e nada. Do tempo
que ultrapassa a lembrança só resta um difuso
relembrar.

                 Certas vezes retorna no dia,
numa imóvel clareza de um dia de estio,
esse espanto longínquo.

                                      Da janela vazia
o menino mirava as colinas na noite,
frias e negras, e olhava espantado o maciço:
vaga e límpida imobilidade. Entre as folhas
farfalhando no escuro, surgiam os cerros
onde todas as coisas do dia, as encostas
e os vinhedos e o verde, eram claras e mortas
e o viver era um outro, de vento, de céu
e de folhas, de nada.

                                E às vezes retorna
no sossego parado de um dia a lembrança
dessa vida alheada na luz espantosa.

Cesare Pavese, Trabalhar cansa – Tradução, Maurício Santana Dias

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