Elisa Lucinda

Elisa Lucinda – Boa-tarde, amor

É melhor não mexer com essa dor…
parece tolice o que você me disse
mas me machucou.
Parece besteira, mas dá uma tristeza
gastar esta tarde sem gestos de amor.
É melhor não mexer com essa dor!
Com o céu azul assim no estampado,
com as matas rompendo concreto com seu rendado,
em meio à cidade do sonho e do vício,
do trânsito do edifício, não acho difícil
a gente reparar — na beleza
a gente achar — a beleza
a gente eleger — a beleza
a gente ficar — na beleza,
pra gente mirar.
Então, por favor,
é melhor não mexer com essa dor!
Parece descaso mas é um estrago
passar essa tarde mexendo no horror.
Parece loucura mas é uma tortura
matar essa tarde lembrando o terror.
É melhor não mexer com essa dor!
Com o dia rolando assim lindo e calado,
com as notas musicais de um teclado,
em meio à cidade do ofício e do riso,
do afeto e do lixo, não acho difícil
a gente pescar — a beleza
a gente sacar — a beleza
a gente firmar — na beleza
a gente espiar — a beleza
a gente se amar — na beleza,
pra gente gozar.
Então, por favor,
é melhor não mexer com essa dor!
Parece mentira mas dá ziquizira
roer esta tarde com ódio e bolor.
Parece bobagem mas é sacanagem
perder esta tarde brindando o rancor.
É melhor não mexer com essa dor,
que a tarde é linda, que a tarde é boa
e, antes que seja tarde, boa tarde, amor!

Elisa Lucinda, A fúria da beleza

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