Elizabeth Bishop

Elizabeth Bishop – Sonho de verão

Elizabeth Bishop
image_pdfimage_print

Aquele cais afundado
recebia poucos barcos.
Lá viviam dois gigantes,
uma anã, um retardado,

um lojista, que toda a manhã
cochilava em seu balcão,
e a simpática senhoria —
a costureira dela era a anã.

O retardado passava o dia
colhendo amoras, para distrair-se,
mas depois as jogava fora.
A costureira miúda sorria.

Nossa pensão, à beira-mar,
azul como uma cavalinha,
era riscada, feito o rosto
de quem acabou de chorar.

Gerânios extraordinários
transbordavam das janelas,
e no assoalho reluziam
linóleos de tipos vários.

À noite a gente escutava
o pio do mocho-orelhudo.
À luz do lampião de óleo
o papel de parede brilhava.

A senhoria simpática
tinha um filho, um gigante gago,
que subia a escada recitando
trechos de uma velha gramática.

Vivia emburrado, o sujeito,
mas a mãe dele era alegre.
O nosso quarto era frio,
e o colchão de penas, estreito.

No escuro, a gente acordava
com o riacho sonâmbulo
que, desaguando no mar,
em voz alta, ainda sonhava.

Elizabeth Bishop, Poemas escolhidos

Você gostou deste poema?

You Might Also Like

No Comments

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.