O amigo, em Lisboa, pergunta o que quero de Lisboa;
nada, respondo, não quero senão o que não vem nos postais
mais um ou dois postais de lugares onde nunca fui feliz
e, ainda assim, agora e sempre, eu quis, não quero, Alberto,
de Lisboa senão o que ela não dá, o que ela guarda e é preciso
roubar, a secreta alegria que não cabe nos guias de turismo,
quero isso, mais uma ou duas coisas que vêm nos guias de turismo.
Vê esses rapazes e moças de olhos azuis? São holandeses.
Esses deuses e essas flores azuis? São azulejos. Como trazê-los?
De nada valem os antiquários; quando voltamos de Lisboa, tudo
o que trazemos, percebemos, está partido, por isso, Alberto,
não vale a pena trazer nada, que daí só trazemos, sem dar conta,
o que nos parte,
o que nos corta,
mal fechamos a mala, mal abrimos a porta.
Eucanaã Ferraz, Sentimental
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