Eugénio de Andrade – Obscuro domínio
Amar-te assim desvelado
entre barro fresco e ardor.
Sorver entre lábios fendidos
o ardor da luz orvalhada.
Deslizar pela vertente
da garganta, ser música
onde o silêncio flui
e se concentra.
Irreprimível queimadura
ou vertigem desdobrada
beijo a beijo,
brancura dilacerada.
Penetrar na doçura da areia
ou do lume,
na luz queimada
da pupila mais azul,
no oiro anoitecido
entre pétalas cerradas,
no alto e navegável
golfo do desejo,
onde o furor habita
crispado de agulhas,
onde faça sangrar
as tuas águas nuas.
Eugénio de Andrade, Obscuro domínio