A mulher sem amor é como o inverno,
Como a luz das antélias no deserto,
Como o espinheiro de isoladas fragas,
Como das ondas o caminho incerto.
A mulher sem amor é — Mancenilha —
Das Armas plagas sobre o chão crescida,
Basta-lhe à sombra repousar um’hora,
Que seu veneno nos corrompe a vida.
De eivado seio no profundo abismo,
Paixões repousam num sudário eterno;
Não há canto nem flor, — não há perfumes,
A mulher sem amor como o inverno.
Su’alma é um alaúde desmontado
Onde embalde o cantor procura um hino;
— Flor sem aromas, — sensitiva morta, —
— Batel nas ondas a vagar sem tino.
Mas se um raio do sol tremendo deixa
Do céu nublado a condensada treva,
A mulher amorosa é mais que um anjo,
— É um sopro de Deus que tudo eleva!
Como o árabe ardente e sequioso
Que a tenda deixa pela noite escura,
E vai no seio de orvalhado lírio
Lamber a medo a divinal frescura:
O poeta a venera no silencio,
Bebe o pranto celeste que ela chora,
Ouve-lhe os cantos, — lhe perfuma a vida,….
— A mulher amorosa é como a aurora!
Fagundes Varela, Noturnas