Queria ser simples. De tudo que já quis,
juro, esse me parece o mais disparatado
dos desejos. De todas as ideias de
merda que tive, essa é a que mais fere.
Queria não me importar se o Noturno número dois
que escuto é mal interpretado. Porque
afinal não entendo de piano e não posso
dizer que essa é uma merda de uma
interpretação. Mas eu sei que é uma
merda e isso me fere os nervos mais que
os ouvidos. Fere tanto quanto a ideia de
ser simples. Queria ser simples a ponto
de ser querida. Querida por ser querida e
não por ser especial. O especial é
complexo. Raro. Intratável em sua
ausência de singeleza. Porque eu poderia
anunciar que sou delicada, e implorar sem
implorar, por cuidados. Queria ser simples
e ser cuidada com esmero. Porque a minha
delicada simplicidade iria sugerir atenção.
A leveza da simplicidade me traria sopas,
bombons, margaridas. Mas eu ganhei fama
e minha criada acaba de trazer um petisco
que só vende em uma padaria bem longe.
Fernanda Young, A mão esquerda de Vênus
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