Fosse eu apenas, não sei onde ou como,
uma coisa existente sem viver,
noite de vida sem amanhecer
entre as sirtes do meu dourado assomo…
Fada maliciosa ou incerto gnomo
fadado houvesse de não pertencer
meu intuito gloríola com ter
a árvore do meu uso o único pomo…
Fosse eu uma metáfora somente
escrita nalgum livro insubsistente
de um poeta antigo, de alma em outras gamas,
mas doente, e, num crepúsculo de espadas,
morrendo entre bandeiras desfraldadas
na última tarde de um império em chamas…
Fernando Pessoa, Livro dos sonetos
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