O primeiro chegou cedo
porque tinha medo
de perder a frente;
o segundo resmunga furibundo
por encontrar alguém
mais eficiente;
o terceiro acha injusto
não ter tomado a ponta
pleiteada a tanto custo;
o quarto,
o quinto,
o sexto
encontram um pretexto
para discutir;
a fila se estica,
vira a esquina,
urina no poste,
chupa tangerina.
Há quem reclame,
há quem goste:
às vezes dá para beliscar
a moça que enfrenta
um décimo sexto lugar.
Se não for assim,
quem é que aguenta?
Depois de tanta demora,
a porta não abre,
a linha se desfaz e vai embora.
Atrás da porta
tem um sonho remoendo,
um plano insistindo,
um sorriso esboçando.
Do lado de fora,
a vida competindo,
o corpo envelhecendo,
a alma duvidando.
A fila amanhã chega sabendo
que a esperança, por prudência, está dormindo,
pois a porta, antes de abrir, já está fechando.
Flora Figueiredo, Amor a céu aberto
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