Que durmam, muito embora, os pálidos amantes,
Que andaram contemplando a lua branca e fria…
Levantai-vos, heróis, e despertai, gigantes!
Já canta pelo azul sereno a cotovia
E já rasga o arado as terras fumegantes…
Entra-nos pelo peito em borbotões joviais
Este sangue de luz que a madrugada entorna!
Poetas, que somos nós? Ferreiros d’arsenais;
É bater, é bater com alma na bigorna
As estrofes de bronze, as lanças e os punhais!
Acendei a fornalha enorme — a Inspiração.
Dai-lhe lenha, — A Verdade, a Justiça, o Direito —
E harmonia e pureza, e febre, e indignação;
E pra que a lavareda irrompa, abri o peito
E atirai ao braseiro, ardendo, o coração!
Há-de-nos devorar, talvez, o incêndio; embora!
O poeta é como o sol: o fogo que ele encerra
É quem espalha a luz nessa amplidão sonora…
Queimemo-nos a nós, iluminando a terra!
Somos lava, e a lava é quem produz a aurora!
Guerra Junqueiro, Poesias Dispersas