Hilda Hilst – XV (amiga, muito amiga)
Amiga, muito amiga.
Tristemente pensei nesses teus olhos tão tristes.
Os homens não mais te compreendem.
A vida, tu mesma compreendeste muito.
O teu grande desejo de cousas novas
desapareceu no rol das cousas velhas.
O teu amor por ele transformou-se
em amor maior: amor por tudo o que se extingue. Nunca foste tão verdadeira
como nestes últimos dias de corajosa submissão.
Se a morte não te amedronta,
acaba placidaniente, sem dizer adeus
aos teus amigos, acaba sem preparação para o final, acaba sem melancolia, acaba sem dó.
E depois… acaba assim: na convicção
de que se não findasses por resolução,
a vida faria de ti, ó doce amiga,
refúgio dos que não mais se entusiasmam,
apoio dos homens solitários.
Hoje e só hoje, pensa com alegria no amor,
pensa que as árvores estão todas em flor: azuis,
amarelas, vermelhas. Pensa que vais acabar
no desespero de um dia de sol…
Pensa naqueles que não são e nunca hão de ser
o que és agora.
Acaba depois sem um soluço, sem tragédia,
sem dizer adeus aos teus amigos,
acaba… só.
Hilda Hilst, Baladas