Jacques Prévert

Jacques Prévert – Burro adormecido

Eis um burro que dorme
Crianças, vejam como ele dorme
Não o acordem
Não lhe preguem peças
Ele é tão infeliz quando não está dormindo.
Não é todo dia que come.
Esquecem de lhe dar de beber.
E como batem no bicho.
Olhem bem
É mais belo que essas estátuas que lhes dizem para admirar e que os deixam entediados.
Está vivo, respira, confortavelmente instalado em seu sonho.
Os mais velhos dizem que a galinha sonha com o grão e o burro com a aveia.
Os mais velhos dizem isso para ter o que dizer, seria melhor que se ocupassem com seus próprios sonhos seus pequenos pesadelos pessoais.
Sobre a grama, ao lado da sua cabeça, há duas penas. Se ele as viu antes de adormecer talvez sonhe que é um pássaro e que voa.
Ou talvez sonhe com outra coisa qualquer.
Por exemplo: que está na escola das crianças, escondido no armário de cartolinas.
Há um menino que não sabe resolver um problema.
Então o professor lhe diz:
Você é um burro, Nicolau!
Que vergonha para o Nicolau.
Vai começar a chorar.
Mas o burro sai do esconderijo
Sem que o professor o veja.
E resolve o problema do menino.
O menino entrega o problema ao professor, e o professor diz:
Muito bem, Nicolau!
Então o burro e Nicolau riem baixinho às gargalhadas, mas o professor não os ouve.
E se o burro não sonha esse sonho
É porque sonha outras coisas.
Tudo o que sabemos é que sonha.
Todo mundo sonha.

 

Jacques Prévert, Dia de folga

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