João Cabral de Melo Neto

João Cabral de Melo Neto – A fábrica de tabacos

joao cabral de melo neto
image_pdfimage_print

Lá trabalharam as cigarreiras,
quase nuas pelo calor,
discutindo, freiras despidas,
teologias de um certo amor.

Enquanto enrolavam cigarros,
se trocavam jaculatórias,
com palavras desse amor cru
omitidos pelas retóricas.

Lá um tempo trabalhou Carmen,
adensando mais a atmosfera
de sexo, de carne mulher,
que isso tudo emanava dela.

Sobre o portal um anjo de pedra:
pronta, na boca, uma trombeta.
Faria soá-la, se dizia,
se um dia entrasse uma donzela.

Hoje, não há mais operárias.
Hoje em dia, é a Universidade.
Tudo mudou, exceto o anjo
que mudo ameaça ainda, debalde.

João Cabral de Melo Neto, A literatura como turismo

Você gostou deste poema?

Você Pode Gostar Também

Sem comentários

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.