I
Tu és a antecipação
do último filme que assistirei.
Fazes calar os astros,
os rádios e as multidões na praça pública.
Eu te assisto imóvel e indiferente.
A cada momento tu te voltas
e lanças no meu encalço
máquinas monstruosas que envenenam reservatórios sobre os quais ganhaste um
domínio de morte.
Trazes encerradas entre os dedos
reservas formidáveis de dinamite
e de fatos diversos.
II
Tu não representas as 24 horas de um dia, os fatos diversos,
o livro e o jornal
que leio neste momento.
Tu os completas e os transcendes.
Tu és completamente revolucionária e criminosa, porque sob teu manto
e sob os pássaros de teu chapéu
desconheço a minha rua,
o meu amigo e o meu cavalo de sela.
João Cabral de Melo Neto, Poemas para ler na Escola