José Paulo Paes – Poema Circense
Atirei meu coração às areias do circo como se atira ao
mar uma âncora aflita. Ninguém bateu palmas.
O trapezista sorriu, o leão farejou-me desdenhosamente,
o palhaço zombou de minha sombra fatídica.
Só a pequena bailarina compreendeu. Em sua mãos
de opala, meu coração refletia as nuvens de outono,
os jogos de infância, as vozes populares.
Depois de muitas quedas, aprendi. Sei agora vestir,
com razoável destreza, os risos da hiena, a frágil polidez
dos elefantes, a elegância marinha dos corcéis.
Todavia, quando as luzes se apagam, readquiro antigos
poderes e voo. Voo para um mundo sem espelhos falsos,
onde o sol devolve a cada coisa a sombra natural
e onde não há aplausos, porque tudo é justo, porque
tudo é bom.
José Paulo Paes, Melhores poemas