Ao entardecer, quando as ruas paralisadas perdem
as esperanças de ouvir soar uma ambulância, decidindo-se afinal
por chineses que passeiam a esmo, enquanto os olmos imitam o mapa
de um país vestido com roupa khaki, que embala seus inimigos,
a vida vai pouco a pouco ficando míope, remendada,
aquilina, geométrica, sem brilho
e sem detalhes – cornijas, maçanetas de porta, Cristos –
que realcem as silhuetas: chaminés, telhados, um crucifixo.
Teu gesto de fechar as persianas desencadeia a teoria
do dominó, pois não importa o tamanho do nó
que se desfaça em tua garganta, as futuras bolas de neve,
à luz da lâmpada, sempre formarão o perfil de um inevitável “não”.
Não é porque, ultimamente, os preços andem salgados,
mas ninguém ousa pegar essa bolsinha de tijolos
cheia de trocados, que mal dá para pagar uma boa noite de sono.
Joseph Brodsky, Poesia soviética
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