Não sei se passou tempo suficiente
mas acho que já posso idealizar
esse concerto de órgão na igreja
que manteve nós dois em silêncio
descansando do calor e da chuva.
No que você pensava?
Você fechou, como eu, os olhos?
Você tinha, como eu, vibrante
na língua o gosto do café?
Eu tirei as sandálias
e apoiei os pés numa almofada
gelada, forrada de corino.
Você deixou cair uma moedinha.
Fez um minúsculo tim-tim e sorrimos.
O órgão nos encantou como serpentes
e por um momento pareceu desenvolver
toda uma série de impressões religiosas
no sentido de algo que podemos chamar
religião: algo que englobe
o amor e a bondade e conduza
diretamente à experiência, esse colchão
concreto que nos dá refúgio e nos sacode.
Laura Wittner, Tradução da estrada
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