Vou deixar meus pátrios lares,
Alheio clima habitar.
Ver outros céus, outros mares,
Noutros campos divagar;
Outras brisas, outros ares,
Longe do meu respirar…
Vou deixar-te, oh! Pátria minha,
Vou longe de ti – viver…
Oh! Essa ideia mesquinha,
Faz meu dorido sofrer;
Pálida, aflita rolinha
De mágoas a estremecer.
Deixar-te, pátria querida.
É deixar de respirar!
Pálida sombra, sentida
Serei – espectro a vagar:
Sem tino, sem ar, sem vida
Por esta terra além-mar.
Quem há de ouvir-me os gemidos
Que arranca profunda dor?
Quem há de meus ais transidos
De virulento amargor,
Escutar – tristes, sentidos,
Com mágoa, com dissabor?
Ninguém. Um rosto a sorrir-me
Não hei de aí encontrar!…
Quando a saudade afligir-me
Ninguém irá me consolar;
Quando a existência fugir-me,
Quem há de me prantear?
Quando sozinho estiver
Aí à noite a cismar
De minha terra, sequer
Não há de brisa passar,
Que agite todo o meu ser,
Com seu macio ondular…
Maria Firmina dos Reis, Antologia de poetas negros do período abolicionista no Brasil