Murilo Mendes – Poema pessoal
Levanto-me da carruagem de paixões e plumas
Aparentemente guiada pelas irmãs Brontë.
Deu uma tristeza agora nos telhados…
As cigarras sublinham a tarde emparedada,
O trovão fechou o piano.
Surge antecipadamente o arco-íris,
Aliança temporária de Deus com o homem,
Sem a solidez da eucaristia:
Surge sobre encarcerados, órfãos, marginais,
Sobre os tristes e os sem-solução.
Dos quatro cantos de mim mesmo
Irrompe um Dedo terribilíssimo que me acusa
Porque sem os olhar deixo de lado
Os restos agonizantes do mundo.
Transformou-se agora o céu.
Céu patinado, que escureza.
Céu sempre futuro e amargo,
Como são fundamentais
Estes sofrimentos de segundo plano!
Mais o que mesmo lembrar?
Ah sim – esta arrastada caranguejola da vida…
Murilo Mendes, Melhores Poemas