Natália Correia – De perfil
Poesia com dor já comprei
ou algo que de poesia
tinha a cordial dissipação
dos poemas que eu não escrevia.
Agora pela romântica
retórica de não ter dinheiro
a vendo avulso mas roubo
no peso como o merceeiro.
Esse pequeno furto é o meu quarto
(de alva) indicador insone
que disca o número de deus
num sub-reptício telefone
deus movediço que é uma rede
de linhas interrompidas
onde caio morta de sede
de jogar comigo às escondidas.
Escondendo o que de frente vejo
de perfil me vedes como os egípcios
não por vício de esconder um deus
mas o deus de esconder um vício.
Se um grama de mim sonego
a que chamo deus por ínvio rito
perdoai-me porque só vos roubo
aquilo em que não acredito.
Natália Correia, A mosca iluminada