Essa possibilidade de escrever versos
Que alguém, um dia, poderá ler
(e sentir algo próximo ao que senti)
Não veio de estudos
De projetos literários
De vocação familiar
Veio de uma saudade
De uma estrada irregular
Que a memória percorre e não esquece
De uma árvore velha, numa antiga aldeia,
Que geme seu tempo
Adorando a noite
Veio de uma janela aberta
Que nunca olhei
Por onde entravam chuvas, pássaros,
folhas, animais,
enfermidades, sopros,
rezas, mortes
Como se tivessem inventado
uma rede de murmúrios
Apenas para brincar
(e deixar a saudade ser minha esperança)
A estrada irregular, portanto
É uma existência efêmera que migrou
Para o meu sangue
Assim me visto para o dia
A cada folha ocupada
Cada palavra enterrada no meu chão
Acalento uma alma antiga
Que nada mais me pede
Samarone Lima, O céu nas mãos
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