Ficaram tão sozinhos,
tão sem nenhuma palavra
e em tal desamor, que um milagre terão merecido —
um raio das altas nuvens, uma petrificação.
Dois milhões de cópias de mitos gregos antigos,
mas para ele e para ela não há salvação.
Se alguém ao menos parasse na porta
se algo, ainda que por instantes, surgisse, sumisse,
divertido, triste, de algum lugar, de lugar algum,
despertando o riso ou o medo, não importa.
Mas nada vai acontecer. Nenhuma inesperada
inverossimilhança. Como num drama burguês a ação
vai seguir até o fim o roteiro da separação,
e no céu nenhuma fenda será avistada.
Com a parede imóvel atrás,
um do outro compadecido,
detêm-se diante do espelho que traz
somente os reflexos conhecidos.
O reflexo de duas pessoas, nada mais.
A Matéria está alerta.
Em seus tamanhos variados
na terra e no céu e pelos lados
vigia os destinos naturais
— como se de uma corça repentina neste quarto
devesse ruir o Universo.
Wisława Szymborska, Para meu coração num domingo